Johan Huizinga, O Outono da Idade Média, Cap. II, p. 63:
p. 65:
"Alguém a quem se destina um beijo na mão a esconde para escapar dessa honra. Assim, a rainha da Espanha esconde sua mão diante do jovem arquiduque Filipe, o Belo; este aguarda por algum tempo e, assim que vê uma oportunidade, agarra a mão de surpresa e a beija. Dessa feita a séria corte espanhola explodiu em gargalhadas, pois a rainha já não esperava por aquele gesto."
(Filipe, o Belo e Joana de Aragão. c. 1505)
p. 66:
"Não é preciso dizer que essa minuciosa ornamentação da vida tem seu lugar sobretudo nas cortes dos soberanos, onde havia tempo e espaço pra isso. Mas também permeavam as esferas inferiores da sociedade - algo comprovado pelo fato de que essas formas sociais continuam preservadas hoje justamente na pequena burguesia (sem se falar nas próprias cortes). O convite reiterado para servir-se de mais comida, a insistência para que a pessoa fique mais um pouco, a recusa em passar na frente de alguém desapareceram em grande parte do comportamento social da alta burguesia na última metade deste século¹. No século XV, essas formas estão em pleno vigor. Ainda quando penosamente observadas, são objeto de sátira mordaz. Encontra-se sobretudo na Igreja o teatro das cerimônias longas e belas. Durante o ofertório, ninguém quer ser o primeiro a levar sua esmola ao altar.
Pode passar. - Ah, não, obrigada. - Por favor!
Sem dúvida vós ireis, prima.
- Não, eu não. - Chame a vizinha.
É melhor que oferte primeiro.
- Vós não deveis tolerar,
Diz a vizinha: Nem me passa pela cabeça:
Oferecei logo, pois depende só de vós
Para que o clérigo continue.²"
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¹ Huizinga viveu na transição do século XIX para o XX. Se estes costumes desapareceram mesmo nessa época, hoje acho que ainda dá pra dizer que estão é bem vivinhos - talvez o último fora de São Paulo.
² Eustache Deschamps (séc. XIV).
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